Q: Pode contar a história por detrás do seu negócio?
“Já existia uma loja de flores no Serra Shopping. A pessoa que estava com a loja desistiu e eu fiquei com o espaço. Estou cá há cerca de 10 anos. Antes, a loja estava em frente às caixas do Continente e atualmente estamos ao pé da Wells.
A mudança tem, aproximadamente, um ano. Já houve várias coisas neste espaço aberto. Começou por ser um café, depois esteve aqui uma loja de informática, e também um fotógrafo. Portanto, eu espero não seguir as pisadas deles e manter-me ainda aqui uns anos.
Neste negócio, o know-how é importante. As floristas vendem flores. Ponto. Só que depois há uma outra vertente que, nos dias de hoje, quase todas as que estão neste ramo têm, que é a arte floral. É preciso saber fazer. Não é só chegar e pura e simplesmente vender uma rosa, uma gerbera ou uma margarida.
Tenho uma funcionária que já teve uma loja de flores por isso já tem esse know-how. A outra empregada vai aprendendo aqui connosco. Começou basicamente do zero. Tem de aprender a fazer coroas, palmas, bouquets, ramos de noiva, ramos de mão. Ainda que o negócio seja mais venda de flor em si, também é preciso fazer esses arranjos.
Quanto às encomendas, se online me mandarem um email ou uma mensagem no Facebook, WhatsApp ou Messenger, então sim, fazemos. Aquilo que nós não fazemos são envios. Se, por exemplo, alguém do Fundão ou de Castelo Branco me pedir, não envio por correio ou por qualquer transportadora.”
Q: Qual foi o percurso profissional que a levou até aqui?
“Eu não tenho nada a ver com esta área. Comecei a trabalhar na parte têxtil, numa pequena empresa de Representações, de matérias-primas como lãs e poliésteres. Depois trabalhei noutros locais, como a Brimtêxtil. Entretanto, fui despedida.
Até conseguir este negócio não houve um intervalo de tempo muito grande, mas também não foi instantâneo. Não foi sair de um lado e entrar para o outro. Na altura, eu estava à procura de qualquer coisa para fazer e surgiu isto. Não era de todo o que eu estava a pensar que ia fazer. E eu venho de uma área de gestão. O meu objetivo era mais de gestão, digamos assim. Mas sempre gostei de flores. Nunca tinha desenvolvido esse gosto, e então, quando surgiu esta oportunidade, juntou-se o útil ao agradável.
Q: Quais foram os obstáculos que hoje definem a resiliência do seu negócio?
“Eu pensei que isto fosse mais fácil do que realmente é. Pensei que tivesse outra rentabilidade e que desse para ter mais empregados do que aquilo que tenho. Como estamos no shopping precisamos de, pelo menos, três pessoas para fazer a rotatividade. Os horários são difíceis e ainda estivemos fechados um mês na altura da pandemia.
Neste momento, acho que o obstáculo atual é a economia. Mesmo as pessoas que gostam de ter flores em casa, cada vez levam menos. Eu quando comecei vendia mais flores do que agora. Nota-se que, das pessoas que vêm, das duas uma: ou têm capacidade e poder de compra e então compram alguma coisa, ou focam-se no pequenino, no simbólico. Mesmo nos dias temáticos, como o Dia da Mãe ou o Dia dos Namorados, cada vez mais se verifica que as pessoas escolhem coisas pequeninas, só para marcar a data. Quanto muito, também se nota a diferença com os imigrantes que chegam e têm uma noção distinta em relação ao dinheiro.
Para nós, uma situação de exemplo são a flores artificias. Nós vendemos, porém não vendemos para decorativos. É mais para cemitérios. O Gato Preto agora mudou um pouco o conceito, mas eles tinham bastantes flores desse género. E é difícil concorrermos com uma mega empresa.
Depois ainda está o IVA. Nesta área trabalhamos com dois. Quando só vendemos plantas e flores, temos uma taxa que é a de 6%. Desde que a gente faça um arranjo, é 23%. É uma diferença enorme e as pessoas não entendem. Essa parte também não nos ajuda de maneira nenhuma.”
Q: O seu comércio criou raízes na Covilhã. Quais são os pontos altos de estar a trabalhar nesta cidade?
“Pelo que eu tenho notado, com a exceção das floristas antigas que trabalham há muitos anos, não resistiu nenhuma das floristas novas que se estabeleceram na rua. É verdade que as despesas de estar num shopping são muito maiores do que na rua. Mas creio que é preferível pagar essas despesas e estar num sítio onde as pessoas vêm. O conceito do shopping é esse. O horário, como é alargado, dá para toda a gente. Há os que podem a certas horas, outros não podem. Há os que vêm à noite. Por isso, há sempre movimento. E o shopping já está praticamente integrado na cidade.
Em termos de negócio, aqui não funcionamos muito com a compra por impulso. Eventualmente, um namorado ou outro que vá ao cinema passa por aqui e compra uma rosa. Mas isso é relativo. As pessoas que vêm aqui aparecem de propósito para comprar algo. Por exemplo, quem tem de ir a um funeral, vem aqui à florista e sabe que encontra o que precisa. A título de curiosidade, no quotidiano da Bem Me Quer o que se vende mais são as plantas em vaso. É o mais comum. As pessoas preferem porque duram mais, mesmo que morram. Inclusive para oferecer.
Há também pessoas que gostam de ter flores em casa, não apenas plantas. Flores para por na jarra, para fazer um centro de mesa. Normalmente, as pessoas levam porque têm um jantar lá em casa ou uma ocasião especial. Este mês que passou, por exemplo, houve muitas Comunhões.
Um ponto alto são os clientes que vêm cá todos os anos, mesmo no Dia da Mãe, no Dia dos Namorados, etc. São clientes que gostam do nosso trabalho, mas também que gostam do shopping. Pessoas que vêm aqui e compram basicamente tudo o que precisam, desde produtos de hipermercado até ao vestuário. Vêm aqui não só porque lhes dá jeito, mas também porque sabem que ficam bem servidos. Há outros clientes que são passageiros.”
Q: Tendo em consideração os diversos desafios e dificuldades que o comércio tradicional e local enfrenta na atualidade, quais são as suas perspetivas para o futuro?
“É manter a atividade. Para já, também não está nos meus planos mudar para um espaço fechado. Aliás, eu saí de um espaço fechado para vir para aqui. Primeiro, por uma questão de área e de renda. Segundo, nem todas as lojas estão adaptadas com água. E nós precisamos de água para trabalhar. Se pudesse escolher outro sítio queria a entrada porque tem mais impacto. Há muito mais movimento daquele lado do que aqui. Mas lá não há esta particularidade, não existe um espaço com água.
Os planos também não envolvem crescer porque não temos por onde nos expandir, nem temos população para tal. Por isso é mesmo manter. É claro que o negócio podia ser melhor, como já foi há uns anos atrás, mas as perspetivas não são essas.
Se a economia mudar, eventualmente o comportamento e a atitude das pessoas das pessoas também mudará. Por exemplo, tradições que já se traziam, como as flores nos funerais e nos casamentos, essas também se estão a perder. Mesmo a nível dos casamentos, há os que são grandes, pomposos e há os que são minimalistas. Estamos a falar numa classe média que abdica desse tipo de coisas, ou então vai para algo mesmo minimalista, como um raminho de noiva ou umas coisinhas nas mesas.
As pessoas com poder de compra, que podem dar nas vistas, têm capacidade e fazem coisas em grande. Os pequeninos não. A maioria das pessoas gosta muito de flores mas não é um bem essencial. Não têm nem compram mais flores porque é um bem do qual se pode abdicar. No dia a dia são poucas as pessoas que levam flores para casa.
Felizmente, temos clientes fidelizados que vêm cá porque gostam. Nem todos os clientes são propriamente anónimos, não é? Há clientes que, graças a Deus, já conheço bem. E vêm quando precisam, seja para um funeral, para um aniversário, ou para outra ocasião.”