Q: Pode contar a história por detrás do seu negócio?
“Eu trabalhava no ramo da sapataria, aqui ao lado no shopping, até que fomos para o desemprego devido à crise de há 10 anos. Ao fim de dois anos resolvemos abrir. Não havia cá nenhuma sapataria e não havia muitas sapatarias na Covilhã, então decidimos apostar na continuação. No recomeçar e na criação do próprio negócio.
A razão de se chamar Sapataria Bellinha é porque eu sou Isabel e a minha mãe era Gabriela. Nós inicialmente abrimos em nome da minha mãe: Gabriela Ramalho. Toda a gente a tratava por Bela. Eu tenho amigos que me tratam por Belinha, então ficou Belinha por causa disso. Houve uma discussão em família e ficou esse nome por quase unanimidade.
A sapataria Bellinha abriu há sete anos. Nós começámos no Centro Comercial da Estação, sendo que estivemos lá cinco anos. E estamos há três anos no Serra Shopping. Inicialmente, durante 4/5 anos, o foco foi só mesmo o calçado. Quando estávamos no Centro Comercial da Estação ainda chegámos a ter outros produtos, mas era uma minoria. Não podíamos ter muitas peças porque a loja também não era grande. Posteriormente, quando viemos para o Serra Shopping, já foi possível aumentar o número de peças. E começámos com a roupa por causa da marca da Cristina Ferreira, para continuarmos com a representação na Covilhã. As representações são importantes. Sermos os únicos a vender a marca na cidade. Na altura foi-me sugerido ficar com a marca da roupa e como eram poucas dava para expor na loja. Depois fomos juntando uma peça ou outra e quando viemos para aqui ficámos com outra marca: a FOURSOUL.”
Q: Qual foi o percurso profissional que a levou até aqui?
“Eu sempre trabalhei e estudei. Trabalhei na sapataria durante muitos anos e também trabalhei como rececionista. Sempre no atendimento ao público. Pode-se dizer que há esse bichinho. Eu também tenho um mestrado em gestão, o que me dá jeito para a loja. Quando acabei o mestrado, eu já não tinha idade para trabalhar na área porque eu tinha entrado para a universidade com 30 anos. Na área da banca, é só até aos 30. Por isso utilizo os conhecimentos de gestão para as coisas do dia a dia da loja e para as contas. Por exemplo, quando vai para a contabilidade já sei o IVA que tenho de pagar.”
Q: Quais foram os obstáculos que hoje definem a resiliência do seu negócio?
“Obstáculos há sempre. Durante um ano ainda tivemos a loja do Centro Comercial da Estação e esta do Serra Shopping em simultâneo, mas depois veio a pandemia e agora só estamos aqui no shopping. O COVID-19 veio dar cabo de muitos negócios e, no meu caso, foi complicado sustentar duas funcionárias.
Na atual localização, um aspeto negativo são os custos inerentes de ter a loja aberta 12 horas por dia, incluindo fins de semana. Além do COVID-19, a guerra é outro dos obstáculos. O aumento do preço generalizado do calçado e dos materiais de calçado, que nos afeta tanto na compra como na venda. Há aqui modelos que aumentaram muito em termos de preço de venda final.
Também há a questão da concorrência. Os chineses, as vendas online. Não me estou a referir às vendas online que têm um negócio por trás e pagam os seus impostos, estou a falar das vendas online que não estão registadas nas Finanças. Acabam por comprar mercadoria sem faturas, vendem e tudo é bom. Não pagam Segurança Social, não pagam IVA, não pagam nada. Isso é um grande obstáculo que nós estamos a enfrentar neste momento.”
Q: O seu comércio deixa uma marca inovadora na Covilhã. Quais são os pontos altos de estar a trabalhar nesta cidade?
“A Covilhã é uma cidade do interior. Temos é a Universidade da Beira Interior, que é um ponto forte. Trata-se de uma cidade turística, com um ponto de passagem para a Serra da Estrela.
O Serra Shopping também é um ponto de passagem. O Centro Comercial da Estação não. É mais recatado. Contudo, no Serra Shopping, as pessoas vêm nem que seja para tomar um café ou para vir almoçar e acabam sempre por dar uma voltinha, o que se traduz depois em algumas vendas. Eu tenho clientes que não me conheciam da Estação e são cá da Covilhã. Porque eles não iam ao Centro Comercial da Estação. Logo, ter vindo para aqui também foi uma forma de me dar a conhecer.
Os imigrantes e os turistas, na época das férias e do Natal também são uma mais-valia. Apesar de, ultimamente, já não virem tanto com o poder de compra que tinham há uns anos atrás, nomeadamente os franceses. Mas sim, eles gostam de comprar o que é português, o que é bom para nós.”
Q: Tendo em consideração os diversos desafios e dificuldades que o comércio tradicional e local enfrenta na atualidade, quais são as suas perspetivas para o futuro?
“Eu tenho muito medo do futuro por causa da crise que estamos a passar. As rendas aumentaram e o nível de vida em si aumentou. Um casal que vive com esses rendimentos vai pensar duas vezes em relação aos excessos, como um par de sapatos, um vestido ou uma camisola. Acho que vamos sentir mais os efeitos desta crise no final deste ano e princípio do ano que vem.
Já na sapataria, os pontos que nós marcamos sempre, como comércio tradicional, são o atendimento personalizado, a qualidade e a diferenciação. É algo que digo às minhas colaboradoras: atendimento personalizado ao máximo. É claro que, se houver muitas pessoas, é mais difícil. Mas se houver uma ou duas pessoas, tentar dar o melhor atendimento possível. Depois, também temos aquelas clientes que se tornam amigas e que tratamos pelo nome. Elas vêm ver, passear, conversar e o comércio tradicional acaba por incluir essa parte do convívio, da amizade. Há essa proximidade com os clientes.
A diferenciação passa por termos produtos que não se encontram por aí. São mais caros, mas depois as pessoas têm aquela diferenciação em termos de qualidade. A qualidade paga-se.
Quanto às perspetivas para o futuro da loja, vamos continuamos a apostar nas vendas online e na divulgação. Todos os dias atualizamos a página do Facebook com as novidades e as promoções. As vendas online foram uma aposta que fiz desde o início. E na pandemia foi o que nos ajudou. Com as lojas fechadas, foi o online que minimizou a crise e permitiu pagar as contas. Atualmente, há dias aqui em que não se passa nada e online até se vende bem. E há dias em que trabalhamos na loja e online não acontece nada. Mas todos os dias sai, no mínimo, uma encomenda.
As encomendas têm um critério: na nova coleção há sempre oferta de portes. Quando estão com 40%, 50% ou 60% de desconto já não. Destaco também que há pessoas da zona que encomendam e depois vêm buscar à loja e outras que não são da região. Há as que são sempre novidade e as que já são fidelizadas, inclusive nas ilhas. Neste momento, as vendas online são, mais ou menos, 30-40% e 60-70% são as físicas. O que é bom.”