Entrevista ao sócio: João Paulo Soares Freire Pereira da Drogaria Moderna*


Q: Pode contar a história por detrás do seu negócio?

“O meu pai começou a trabalhar muito cedo, por volta dos 14/15 anos de idade. Ele trabalhou em farmácia até aos 30 anos. Aos 30 é que se estabelece com o ramo da Drogaria e abre esta loja, já depois de ter trabalhado cerca de 14/15 anos numa farmácia, como ajudante. Por ter trabalhado numa farmácia acaba por transportar para a Drogaria a elaboração de manipulados, porque as Drogarias assim o permitiam na altura. Então ele veio com essa informação, essa sabedoria toda, o que fez com que a Drogaria, quando abriu portas, tivesse bastante sucesso.

O meu pai também já era muito conhecido da farmácia. E àquela data faziam-se muitas coisas em Drogaria, quase tudo, desde dentífricos, pós desodorizantes…Era tudo feito com fórmulas, ou seja, misturando os produtos químicos para fazer cremes, cerveja ou pó de arroz. Manipulavam as coisas no laboratório, usando balanças da época (1950). Faziam-se muitos manipulados na drogaria – era assim que se chamavam. Eu, depois de já vir para cá, passados muitos anos, também fiz algumas coisas, como a cera, por exemplo. E, com o passar do tempo, a casa foi criando algum nome.

Se perguntar, o que é vende uma Drogaria? Basicamente, utilidades pessoais e do lar, produtos químicos e algum material de laboratório, que já se vendeu mais do que se vende agora, produtos de limpeza e manutenção, saboaria, tenho muitos produtos porque agora os sabonetes estão outra vez na moda, higiene pessoal, cuidados e especialidades diversas, por exemplo, o açafrão que é um produto muito nosso por causa do Pastel de Molho. Sempre vendi açafrão verdadeiro, também se vendia canela em casca e ainda vendo, canela em pó, e muitas mais coisas – incenso, mirra, entre outros. Hoje em dia já não se fazem esses manipulados, mas estão outra vez a começar, com a Internet, as mezinhas que vão aparecendo e com os Do It Yourself (DIY). Então começo outra vez a ter alguma sorte com isso porque tenho alguns desses produtos químicos, desde o bicarbonato de sódio, a outras coisas.”

Q: Qual foi o percurso profissional que o levou até este estabelecimento?

“Como é que venho parar aqui? Vim parar aqui porque não quis estudar. Eu cheguei ao 11º ano, comecei a patinar, também queria pouco saber e estudava pouco. Não foi por falta de inteligência, foi mais por falta de aplicação. Então acabei por ir trabalhar noutros lados. Na altura, o meu pai não me queria dar um ordenado. Há sempre esse conflito geracional entre pais e filhos. O meu pai também era assim austero nessa medida.

O tempo foi passando, ele foi envelhecendo e eu fui-me mantendo por perto, umas vezes mais integrado, outras vezes menos. Tive um percurso um pouco rebelde na minha juventude, mas acabei por pegar na casa e cá estou até à data. O meu pai teve cá 50 anos, faleceu em 2003, e eu estou cá há 22 anos. Já a tomar mesmo conta da Drogaria.”

Q: Quais foram os obstáculos ultrapassados que hoje definem a resiliência do seu negócio?

“Se a loja ainda está aberta foi porque eu tive a capacidade de apanhar o comboio da digitalização. Ou seja, para além de ter a loja online desde 2012, sempre estive atento a esta parte toda do digital e redes sociais. Quando foi o boom das redes sociais criei perfil no Facebook e perfil no Instagram. Ultimamente, já nos últimos dois/três anos, tenho feito algumas formações na área do marketing digital, através da Associação Empresarial da Covilhã, Belmonte e Penamacor. Inscrevi-me logo quando apareceram para tentar ser mais assertivo naquilo que fazia. E também já não sou novo, mas sempre tive esta veia de gostar destas coisas da Internet e de saber mexer e acabo por ser eu a fazer os meus conteúdos.

Trabalho bem com vídeo, faço edição de vídeo, edição de imagem, vou mexendo com programas, os que não sei começo a praticar e a mexer neles. Tem sido por aí que a coisa tem ido. Isto também aproveitando o interesse crescente nestas coisas dos antigos, das coisas mais vintage. Mantive também a traça do estabelecimento e até inclusivamente tirei algumas coisas que o meu pai tinha feito menos bem, ao estragar o que estava antigo, e voltei a pôr como estava. Fiz assim uns upgrades.”

Q: Quais são os pontos altos de estar/trabalhar nesta cidade?

“A Covilhã é uma cidade que em termos comerciais não é das melhores cidades. Mas lá está, o digital veio potenciar essa situação. Porque eu, ao estar no digital e mostrando as coisas, chamo para cá as pessoas. E tenho de ter a loja. A oferta também tem de ser diversificada e de acompanhar as tendências. Existe uma tendência crescente no amigo do ambiente e no ser sustentável. Começar a ter produtos que as pessoas querem, não é continuar a querer empurrar coisas que vão saindo. A gente explicar as coisas, o que não acontece nas grandes superfícies. O atendimento personalizado, o estar atento às novas tendências de mercado, digitalização, redes sociais, apanhar o comboio digital. O facto de aqui termos a serra também tem ajudado, o ser da Covilhã, é um ponto de passagem.”

Q: Tendo em consideração os diversos desafios e dificuldades que o comércio tradicional e local enfrenta na atualidade, quais são as suas perspetivas para o futuro?

“Temos de acompanhar e estar sempre atentos ao que está aí, se o Facebook deixar de dar temos de ir para outras plataformas. Mas eu acho que isto não vai parar, acho que a tendência vai ser cada vez mais o digital. A loja online, neste momento, já tem um peso completamente diferente do que tinha há uns dois anos ou três atrás. Está sempre em constante crescimento. Representa cerca de 30% do volume de vendas, o que já é muito bom, e sempre a crescer. Este ano pensava que não ia crescer, mas já tenho ali no backoffice um aumento na casa dos 20%, se bem que nos anos anteriores à pandemia foram aumentos de 60 e 100% do volume de negócios na loja online. Com as redes sociais também aumentei o balcão, porque acabo por chegar não só às pessoas que não são daqui e que acabam por vir à loja física. Somos uma zona turística, as pessoas vêm à serra ou assim, isso acaba por lhes despertar o interesse e vêm aqui diretamente à loja”.

 

*Esta entrevista foi realizada no dia 17 de novembro de 2022.

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