Foi publicada a Lei n.º 83/2021, de 6 de dezembro. Entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2022 e modifica o
regime do teletrabalho.
1. Regras legais reguladoras do teletrabalho – seu afastamento por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
Doravante, as normas legais reguladoras do teletrabalho só podem ser afastadas por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que, sem oposição daquelas normas, disponha em sentido mais favorável aos trabalhadores.
2. Noção de teletrabalho e âmbito do regime.
I. Considera-se teletrabalho a prestação de trabalho em regime de subordinação jurídica do trabalhador a um empregador, em local não determinado por este, através do recurso a tecnologias de informação e comunicação.
II. Várias das novas disposições que, no Código do Trabalho, passam a regular o teletrabalho aplicam-se a todas as situações de trabalho à distância sem subordinação jurídica, mas em regime de dependência económica. Ou seja, a situações de trabalho à distância fora âmbito de contrato de trabalho sempre que deva considerar-se que o prestador de serviços está na dependência económica do beneficiário da prestação, nomeadamente por este ser o único beneficiário da
prestação de serviços.
3. Acordo para prestação de teletrabalho
I. Pode exercer a atividade em regime de teletrabalho um trabalhador da empresa ou outro admitido para o efeito.
II. A instituição do regime de teletrabalho em cada caso concreto depende sempre de acordo escrito, que pode constar do contrato de trabalho inicial ou ser autónomo em relação a este. No acordo de teletrabalho deve estar definido o regime de permanência ou de alternância de períodos de trabalho à distância e de trabalho presencial, ou seja, quais os períodos em que o teletrabalhador está vinculado a prestar atividade em teletrabalho.
III. O acordo deve conter e definir, nomeadamente:
a) A identificação, assinaturas e domicílio ou sede das partes;
b) O local em que o trabalhador realizará habitualmente o seu trabalho, o qual será considerado, para todos os efeitos legais, o seu local de trabalho; o local de trabalho previsto no acordo de teletrabalho pode ser alterado pelo trabalhador, mediante acordo escrito com o empregador.
c) O período normal do trabalho diário e semanal;
d) O horário de trabalho;
e) A atividade contratada, com indicação da categoria correspondente;
f) A retribuição a que o trabalhador terá direito, incluindo prestações complementares e acessórias;
g) A propriedade dos instrumentos de trabalho, bem como o responsável pela respetiva instalação e manutenção;
h) A periodicidade e o modo de concretização dos contactos presenciais entre teletrabalhador e empregador.
4. Oposição do trabalhador e do empregador à proposta de teletrabalho.
I. Se a proposta de acordo de teletrabalho partir do empregador, a oposição do trabalhador não tem de ser fundamentada, não podendo a recusa constituir causa de despedimento ou fundamento da aplicação de qualquer sanção.
II. No caso de a atividade contratada com o trabalhador ser, pela forma como se insere no funcionamento da empresa, e tendo em conta os recursos de que esta dispõe, compatível com o regime de teletrabalho, a proposta de acordo feita pelo trabalhador só pode ser recusada pelo empregador por escrito e com indicação do fundamento da recusa.
III. Esta regra deixa alguma margem de discricionariedade à apreciação da proposta de passagem ao regime de teletrabalho formulada pelo trabalhador. Na verdade, tal proposta não é irrecusável, podendo ser rejeitada nomeadamente nos casos em que for incompatível com o bom funcionamento da empresa ou com os recursos de que esta dispõe. Aliás, o empregador pode definir, por regulamento interno publicitado, e com observância do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados, as atividades e as condições em que a adoção do teletrabalho na empresa poderá ser por ele aceite.
5. Duração e cessação do acordo de teletrabalho.
I. O acordo de teletrabalho pode ser celebrado com duração determinada ou indeterminada (com termo ou sem termo).
II. Sendo o acordo de teletrabalho celebrado com duração determinada, este não pode exceder seis meses, renovando-se automaticamente por iguais períodos, se nenhuma das partes declarar por escrito, até 15 dias antes do seu término, que não pretende a renovação. Sendo o acordo de duração indeterminada, qualquer das partes pode fazê-lo cessar mediante comunicação escrita, que produzirá efeitos no 60.o dia posterior àquela. Qualquer das partes pode denunciar o acordo durante os primeiros 30 dias da sua execução.
III. Cessando o acordo de teletrabalho no âmbito de um contrato de trabalho de duração indeterminada, ou cujo termo não tenha sido atingido, o trabalhador retoma a atividade em regime presencial, sem prejuízo da sua categoria, antiguidade e quaisquer outros direitos reconhecidos aos trabalhadores em regime presencial com funções e duração do trabalho
idênticas.
6. Equipamentos e sistemas.
I. O empregador é responsável pela disponibilização ao trabalhador dos equipamentos e sistemas necessários à realização do trabalho e à interação trabalhador-empregador, devendo o acordo de teletrabalho especificar se são fornecidos diretamente ou adquiridos pelo trabalhador, com a concordância do empregador acerca das suas características e preços.
II. São integralmente compensadas pelo empregador todas as despesas adicionais que, comprovadamente, o trabalhador suporte como direta consequência da aquisição ou uso dos equipamentos e sistemas informáticos ou telemáticos necessários à realização do trabalho, incluindo os acréscimos de custos de energia e da rede instalada no local de trabalho em condições de velocidade compatível com as necessidades de comunicação de serviço, assim como os custos de manutenção dos mesmos equipamentos e sistemas. A compensação prevista é considerada, para efeitos fiscais, custo para o empregador e não constitui rendimento do trabalhador.
Consideram-se despesas adicionais as correspondentes à aquisição de bens e ou serviços de que o trabalhador não dispunha antes da celebração do acordo de teletrabalho, assim como as determinadas por comparação com as despesas homólogas do trabalhador no mesmo mês do último ano anterior à aplicação desse acordo. O pagamento da compensação é devido imediatamente após a realização das despesas pelo trabalhador.
III. Sendo os equipamentos e sistemas utilizados no teletrabalho fornecidos pelo empregador, as condições para o seu uso para além das necessidades do serviço são as estabelecidas por regulamento interno a aprovar pelo empregador, referido em 4-II. No caso de inexistência do regulamento interno ou de este omitir as condições mencionadas em II, estas são definidas pelo acordo de teletrabalho.
7. Igualdade de direitos e deveres.
I. O trabalhador em regime de teletrabalho tem os mesmos direitos e deveres dos demais trabalhadores da empresa com a mesma categoria ou com função idêntica, nomeadamente no que se refere a formação, promoção na carreira, limites da duração do trabalho, períodos de descanso, incluindo férias pagas, proteção da saúde e segurança no trabalho, reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais, e acesso a informação das estruturas representativas dos
trabalhadores, incluindo o direito a:
a) Receber, no mínimo, a retribuição equivalente à que auferiria em regime presencial, com a mesma categoria e função idêntica;
b) Participar presencialmente em reuniões que se efetuem nas instalações da empresa mediante convocação das comissões sindicais e intersindicais ou da comissão de trabalhadores, nos termos da lei;
c) Integrar o número de trabalhadores da empresa para todos os efeitos relativos a estruturas de representação coletiva, podendo candidatar-se a essas estruturas.
II. O trabalhador pode utilizar as tecnologias de informação e de comunicação afetas à prestação de trabalho para participar em reunião promovida no local de trabalho por estrutura de representação coletiva dos trabalhadores.
III. Qualquer estrutura de representação coletiva dos trabalhadores pode utilizar as tecnologias referidas para, no exercício da sua atividade, comunicar com o trabalhador em regime de teletrabalho.
8. Tempos de trabalho e tempos de repouso. Privacidade.
I. O empregador deve respeitar a privacidade do trabalhador, o horário de trabalho e os tempos de descanso e de repouso da família deste, bem como proporcionar-lhe boas condições de trabalho, tanto do ponto de vista físico como psíquico.
O empregador tem o dever de se abster de contactar o trabalhador no período de descanso, ressalvadas as situações de força maior. Constitui ação discriminatória qualquer tratamento menos favorável dado a trabalhador, designadamente em matéria de condições de trabalho e de progressão na carreira, pelo facto de exercer o direito ao período de descanso.
II. Sempre que o teletrabalho seja realizado no domicílio do trabalhador, a visita ao local de trabalho requer aviso prévio de 24 horas e concordância do trabalhador. A visita prevista só deve ter por objeto o controlo da atividade laboral, bem como dos instrumentos de trabalho, e apenas pode ser efetuada na presença do trabalhador durante o horário de trabalho acordado. No acesso ao domicílio do trabalhador, as ações integradas pelo empregador devem ser adequadas e proporcionais aos objetivos e finalidade da visita.
III. É vedada a captura e utilização de imagem, de som, de escrita, de histórico, ou o recurso a outros meios de controlo que possam afetar o direito à privacidade do trabalhador.
9. Direito ao regime de teletrabalho em casos especiais.
I. O trabalhador com filho com idade até 3 anos tem direito a exercer a atividade em regime de teletrabalho, quando este seja compatível com a atividade desempenhada e o empregador disponha de recursos e meios para o efeito.
Salvo nas microempresas, o referido direito pode ser estendido até aos 8 anos de idade nas seguintes situações:
a) Nos casos em que ambos os progenitores reúnem condições para o exercício da atividade em regime de teletrabalho, desde que este seja exercido por ambos em períodos sucessivos de igual duração num prazo de referência máxima de 12 meses;
b) Famílias monoparentais ou situações em que apenas um dos progenitores, comprovadamente, reúne condições para o exercício da atividade em regime de teletrabalho. O empregador não pode opor-se ao pedido do trabalhador efetuado nos termos acima referidos.
II. Tem ainda direito a exercer a atividade em regime de teletrabalho, pelo período máximo de quatro anos seguidos ou interpolados, o trabalhador a quem tenha sido reconhecido o estatuto de cuidador informal não principal, mediante comprovação do mesmo, nos termos da legislação aplicável, quando este seja compatível com a atividade desempenhada e o empregador disponha de recursos e meios para o efeito.
Neste caso, o empregador pode opor-se ao direito referido quando não estejam reunidas as condições aí previstas ou com fundamento em exigências imperiosas do funcionamento da empresa.
10. Organização, direção e controlo do trabalho.
I. As reuniões de trabalho à distância, assim como as tarefas que, pela sua natureza, devem ser realizadas em tempos precisos e em articulação com outros trabalhadores, devem ter lugar dentro do horário de trabalho e ser agendadas preferencialmente com 24 horas de antecedência.
II. O trabalhador é obrigado a comparecer nas instalações da empresa ou noutro local designado pelo empregador, para reuniões, ações de formação e outras situações que exijam presença física, para as quais tenha sido convocado com, pelo menos, 24 horas de antecedência. O empregador suporta o custo das deslocações na parte em que, eventualmente, exceda o custo normal do transporte entre o domicílio do trabalhador e o local em que normalmente prestaria trabalho em regime presencial.
III. Os poderes de direção e controlo da prestação de trabalho no teletrabalho são exercidos preferencialmente por meio dos equipamentos e sistemas de comunicação e informação afetos à atividade do trabalhador, segundo procedimentos previamente conhecidos por ele e compatíveis com o respeito pela sua privacidade.
IV. O controlo da prestação de trabalho, por parte do empregador, deve respeitar os princípios da proporcionalidade e da transparência, sendo proibido impor a conexão permanente, durante a jornada de trabalho, por meio de imagem ou som.
11. Deveres especiais para empregador e trabalhador.
I. O regime de teletrabalho implica, para o empregador, os seguintes deveres especiais:
a) Informar o trabalhador, quando necessário, acerca das características e do modo de utilização de todos os dispositivos, programas e sistemas adotados para acompanhar à distância a sua atividade;
b) Abster-se de contactar o trabalhador no período de descanso;
c) Diligenciar no sentido da redução do isolamento do trabalhador, promovendo, com a periodicidade estabelecida no acordo de teletrabalho, ou, em caso de omissão, com intervalos não superiores a dois meses, contactos presenciais dele com as chefias e demais trabalhadores;
d) Garantir ou custear as ações de manutenção e de correção de avarias do equipamento e dos sistemas utilizados no teletrabalho, independentemente da sua propriedade;
e) Consultar o trabalhador, por escrito, antes de introduzir mudanças nos equipamentos e sistemas utilizados na prestação de trabalho, nas funções atribuídas ou em qualquer característica da atividade contratada;
f) Facultar ao trabalhador a formação de que este careça para o uso adequado e produtivo dos equipamentos e sistemas que serão utilizados por este no teletrabalho.
II. O teletrabalho implica, para o trabalhador, os seguintes deveres especiais:
a) Informar atempadamente a empresa de quaisquer avarias ou defeitos de funcionamento dos equipamentos e sistemas utilizados na prestação de trabalho;
b) Cumprir as instruções do empregador no respeitante à segurança da informação utilizada ou produzida no desenvolvimento da atividade contratada;
c) Respeitar e observar as restrições e os condicionamentos que o empregador defina previamente, no tocante ao uso para fins pessoais dos equipamentos e sistemas de trabalho fornecidos por aquele;
d) Observar as diretrizes do empregador em matéria de saúde e segurança no trabalho. As infrações dos deveres indicados podem implicar, além de responsabilidade disciplinar, responsabilidade civil, nos termos gerais.
12. Segurança e saúde no trabalho.
I. É vedada a prática de teletrabalho em atividades que impliquem o uso ou contacto com substâncias e materiais perigosos para a saúde ou a integridade física do trabalhador, exceto se efetuados em instalações certificadas para o efeito.
II. O empregador organiza em moldes específicos e adequados, com respeito pela privacidade do trabalhador, os meios necessários ao cumprimento das suas responsabilidades em matéria de saúde e segurança no trabalho.
O empregador promove a realização de exames de saúde no trabalho antes da aplicação do teletrabalho e, posteriormente, exames anuais para avaliação da aptidão física e psíquica do trabalhador para o exercício da atividade, a repercussão desta e das condições em que é prestada na sua saúde, assim como das medidas preventivas que se mostrem adequadas.
O trabalhador faculta o acesso ao local onde presta trabalho aos profissionais designados pelo empregador que, nos termos da lei, têm a seu cargo a avaliação e o controlo das condições de segurança e saúde no trabalho, em período previamente acordado, entre as 9 e as 19 horas, dentro do horário de trabalho.
III. O regime legal de reparação dos acidentes de trabalho e doenças profissionais aplica-se às situações de teletrabalho, considerando-se local de trabalho o local escolhido pelo trabalhador para exercer habitualmente a sua atividade e tempo de trabalho todo aquele em que, comprovadamente, esteja a prestar o seu trabalho ao empregador.
13. Fiscalização.
I. Cabe à Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) fiscalizar o cumprimento das normas reguladoras do regime de teletrabalho, incluindo a legislação relativa à segurança e saúde no trabalho, e contribuir para a prevenção dos riscos profissionais inerentes a essa forma de prestação de trabalho.
II. As ações de fiscalização que impliquem visitas de autoridades inspetivas ao domicílio do trabalhador requerem a anuência do trabalhador e a comunicação da sua realização com a antecedência mínima de 48 horas.
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